Thursday, October 13, 2005

Respirando a tarde perfumada


Havia um pequeno bar onde ela gostava de vir, no Verão, tomar sorvete e comer talhadas de melancia. Chegava sempre atrasada, regressando, provavelmente, de qualquer encontro num gabinete de persianas cerradas, mas eu fazia por não adivinhar essas coisas quando a sua boca, maravilhosamente fresca e jovem, procurava saciar nos meus lábios uma infinita sede estival. Talvez na sua memória ainda agonizasse a imagem do homem que acabava de deixar, e no seu corpo arrefecesse ainda o calor dos beijos recebidos. Mas isso não tinha a menor importância; só contava, agora, a suave curva do seu braço que envolvia o meu, e eu gozava uma felicidade completa porque nela não existiam segredos. Era bom estarmos assim, perturbados e ligeiramente embaraçados, um pouco oprimidos pelo conhecimento partilhado do nosso desejo recíproco. As mensagens não se detinham na consciência, atravessavam espontaneamente os lábios entreabertos, os olhos, os sorvetes e a lojeca de toldo vivamente colorido. Éramos uma parte da cidade, e ali estávamos, com os dedos entrecruzados, respirando a tarde perfumada de aromas de cânfora.

Lawrence Durrel

In. «Quarteto de Alexandria - Justine»

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